Índice
Investigação deflagrada pela Polícia Federal e pela Controladoria-Geral da União no mês passado revelou que, pelo menos desde 2019, associações vinculadas ao INSS descontavam parte dos benefícios de aposentados e pensionistas — a título de oferecer algum serviço —, mas sem ter a autorização da pessoa.
O esquema pode ter desviado R$ 6 bilhões, de acordo com a PF.
Os períodos de maior adesão
O INSS passou os dados por meio de um pedido formulado na Lei de Acesso à Informação.
Na resposta o órgão justificou que possui dados com a quantidade de descontos realizados apenas a partir de março de 2020 e não do período completo em que os descontos eram realizados, pelo menos, desde 2014.
Os números do INSS se referem à variação, em cada mês, do número de novos associados menos a quantidade daqueles que saíram.
O ano de 2023 representa a maior alta no saldo de associados. Mas houve picos significativos em meses dos anos anteriores, como novembro de 2021 e julho de 2022.
As investigações ainda não apontam exatamente que fatores são determinantes para uma explosão na quantidade de associados com desconto.
Além disso, há uma queda de adesões em 2024 que coincide com a adoção da biometria para autorizações (veja mais abaixo).
Nesta segunda (19), o INSS anunciou que a biometria passa a ser obrigatória para toda autorização de descontos.
Variação anual de associados com desconto
Entre março de 2020 e janeiro de 2025
Fonte: INSS
Análise por meses
No primeiro mês com variação disponível, abril de 2020, a quantidade total de descontos aumentou em 58 mil, puxado pelo registro de 60 mil novos descontos pela Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares do Brasil (Conafer).
Por outro lado, a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) teve uma redução de 4,6 mil associados. Assim, o mês de abril teve um aumento de 2,89% em relação a quantidade registrada em março de 2020, 2.011.459.
Variação de associados com desconto em 2020
Fonte: INSS
Nos quatro meses seguintes, a quantidade de descontos continuou aumentando a uma média de 20.406 novos associados. E a Conafer continuou como a principal associação em adições.
O documento da Polícia apontava uma inclusão de 73.108 novos cadastrados entre abril e julho de 2020. Entretanto, a base do INSS mostra que o número é ainda maior e no período, pelo menos 133.598 novos beneficiários na base.
Entretanto, a partir de setembro de 2020 a quantidade sofre uma queda abrupta e a média se manteve em 2.724 até dezembro.
Variação de associados com desconto em 2021
Fonte: INSS
O ano de 2021 começou com mais saídas de novos associados do que entradas, também puxada pela Conafer, que em fevereiro registrou uma redução de 35.987 em sua base de associados.
Coincidentemente, à época o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) apontou para o INSS movimentações estranhas por parte das associadas, devido o aumento significativo de cadastros em 2020. Mas a apuração de irregularidades não foi para frente.
Assim, a situação se manteve negativa até junho daquele ano. No mês seguinte, a base de associados voltou a aumentar em 17.909. Os meses de agosto e setembro registraram aumento menor de 10 mil e em outubro houve um novo pico, de 25 mil novas inscrições, movida pela entrada da União Brasileira de Aposentados da Previdência (Unibap), que registrou 22 mil novos inscritos.
INSS vai exigir biometria para desbloquear novos empréstimos consignados
A partir de então, novas associações começaram a fazer acordos de cooperação técnica com o INSS e passaram a fazer descontos em aposentadorias.
Em novembro de 2021 a Associação dos Aposentados e Pensionistas do Brasil (AAPB) adicionou 50 mil descontos de uma só vez. No mês seguinte, sua base de descontos reduziu em 49 mil. E em janeiro de 2022, a quantidade voltou a aumentar em 48 mil.
Quebra dos 100 mil
O ano de 2022 começou com média de aumento de 32.946 descontos por mês. Movido, principalmente, por adições da AAPB e Conafer, que mensalmente sempre registrou uma grande quantidade de novos contratos.
Variação de associados com desconto em 2022
Fonte: INSS
Em março, a Associação de Aposentados Mutualista para Benefícios Coletivos (Ambec), que já estava habilitada a cobrar descontos de R$ 45 desde setembro de 2021, começou a adicionar aposentados a sua base. Foram 27 mil em um único mês.
Até que em julho, boa parte das demais entidades já se movimentava com grandes adições ao ponto do mês registrar pela primeira vez mais de 100 mil novos associados descontados em relação ao mês anterior, foram 111.459, entre 16 entidades.
Neste mês, a Conafer viu sua base de afiliados aumentar em 46,8 mil. Além disso, duas entidades começaram a cobrar descontos de seus associados, União Nacional de Auxílio aos Servidores Públicos (Unaspub), com 32 mil adesões e a Associação dos Aposentados e Pensionistas dos Regimes Geral da Previdência Social (AAPPS), com outros 4 mil.
Essa quebra da barreira de 100 mil associados se torna um marco importante na análise, já que a partir de julho de 2022, essa quantidade seria superada constantemente.
Perfil falso do INSS engana aposentados com promessa de reembolso — Foto: Reprodução/TV Globo
Quebra dos 300 mil
Exatamente um ano depois, em um momento em que 25 entidades praticavam o desconto de associado, um novo grande pico surge, 380 mil novos aposentados passaram a ter um percentual descontado em seus contracheques.
Variação de associados com desconto em 2023
Fonte: INSS
O aumento foi puxado pela Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura (CBPA), criada em 2020 e habilitada a fazer descontos desde 2022, que aumentou sua base de contribuintes em 190.193 descontos.
A Conafer e a Ambec, que já vinham com grandes adições em meses anteriores, também contribuíram para que a marca fosse ultrapassada. Juntos, apenas neste mês, eles aumentaram o número de associados em 89 mil aposentados.
Da mesma forma que aconteceu no ano anterior, onde a transposição da barreira dos 100 mil provocou uma aceleração de novas adesões nos meses seguintes, em 2023, após passar os 300 mil associados em um único mês, nos meses seguintes as associações aceleraram ainda mias a inscrição de novos descontos.
Em outubro do mesmo ano foram 384 mil, em novembro 328 mil e dezembro registrou 317 mil.
Chegada da biometria
O então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, demitido após Operação Sem Desconto, assinou uma instrução normativa obrigando que todos os cadastros de desconto, a partir de 2021, contivessem assinatura digital e biometria facial dos participantes. O documento foi publicado em março de 2024.
Variação de associados com desconto em 2024
Fonte: INSS
O mês de janeiro de 2024 quase que dobrou a quantidade de novos associados em relação a dezembro de 2023. Saltando de 317 mil registros para 630 mil.
Com isso, a base de associados disparou e ultrapassou a marca de 6 milhões.
Em março um novo recorde: 796.600 novos associados com desconto. 7,2 milhões ao todo. Naquele mês, foi publicada a regra da biometria, com efeitos práticos a partir de abril.
Em abril, as associações tiveram ligeira redução de novos associados, 659 mil. E chegaram a 7,.9 milhões idosos e pensionistas com descontos em folha. A maior quantidade da série histórica.
A partir dai, as associações acumularam seguidas diminuições da base, com oito meses gerando mais saídas do que novas adesões.