A denúncia era contra duas lideranças do Movimento Xingu Vivo, uma diretora da ONG Amazon Watch e outras pessoas que apoiaram ou pesquisaram o acampamento organizado em protesto à cessão irregular de lotes de reforma agrária para o projeto de mineração.
Na decisão, o juiz declarou extinta a punibilidade dos acusados e determinou o arquivamento do processo.
A queixa-crime foi protocolada em agosto de 2023 pela Belo Sun pedindo prisão em flagrante, busca e apreensão de bens, bloqueio de contas e confisco de supostas armas. Os alvos eram majoritariamente camponeses que, desde 2022, ocupam a área contra a transferência de 21 lotes do assentamento Ressaca para a Belo Sun. Na área, a empresa pretende construir a maior mina de ouro a céu aberto do Brasil.
O empreendimento fica no município de Senador José Porfírio (PA), a menos de 16 km da barragem principal da usina hidrelétrica de Belo Monte e a menos de 11,5 km da Terra Indígena (TI) Paquiçamba. O g1 solicitou posicionamento da Belo Sun e aguardava resposta até a publicação desta reportagem.
Segundo o juiz, a queixa-crime estava “tecnicamente inapta para tramitar” por não atender ao artigo 44 do Código de Processo Penal. O magistrado também reconheceu a decadência do direito de queixa, já que a mineradora perdeu prazo legal para acionar judicialmente os acusados.
Um relatório da Amazon Watch cita que a sentença “confirma denúncia de organizações locais e internacionais sobre uso de medidas judiciais e forças de segurança privada como estratégia de assédio por parte da Belo Sun”. Segundo o documento, a empresa já foi acionada na Justiça por impedir a livre circulação de moradores e restringir práticas tradicionais como a pesca e a coleta de castanha, em áreas públicas da Volta Grande do Xingu.
Um dos agricultores processados, que teve a identidade preservada pela reportagem, afirma que a comunidade “estava passando necessidade, sem terra pra plantar”.
“Quando soubemos que o Incra tinha entregue os lotes para uma mineradora estrangeira, resolvemos lutar. Hoje nossas roças estão tão cheias: tem milho, cupuaçu, arroz, galinha… Já fomos cadastrados pelo Incra, e a Justiça agora tá reconhecendo que nosso protesto é legítimo”, afirmou.
O acordo entre o Incra e a mineradora, assinado em 2021, é alvo de duas ações judiciais — uma delas movida pelas Defensorias Públicas da União e do Estado do Pará, que já obtiveram uma decisão de primeira instância anulando a cessão dos lotes. Outra contestação tramita no Tribunal de Contas da União (TCU).
Denúncias
O projeto Belo Sun é alvo de processos e denúncias por violações aos direitos humanos, uso indevido de terras públicas e ausência de consulta prévia, livre e informada às comunidades impactadas, como exige a Convenção 169 da OIT.
O projeto da mineradora encontra-se com o licenciamento suspenso desde 2017, e enfrenta oposição de movimentos sociais, pesquisadores, comunidades locais e parlamentares, além de críticas internacionais pelo risco de danos irreversíveis ao rio Xingu e à biodiversidade amazônica.
Licenciamento de projeto Belo Sun Mineração tem novo episódio na Justiça do Pará
Em 2022, um relatório da Amazon Watch e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) destacou o projeto no Pará como “um dos casos mais graves de violação de direitos associados à mineração na Amazônia”.
“Desde abril de 2021 representantes de empresa de segurança patrimonial contratada pela Belo Sun têm circulado armados pelas Vilas Ouro Verde, Ressaca e pelo Garimpo do Galo”, relata o documento. “A presença dessa força armada particular em terras públicas, agindo em nome da empresa Belo Sun, assusta e ameaça as comunidades tradicionais”.
O relatório também denuncia a criminalização de práticas tradicionais como pesca, caça e coleta de açaí, com instalação de placas proibitivas pela empresa, o que gerou decisão judicial exigindo a retirada imediata das restrições.